quarta-feira, 12 de novembro de 2008

África?, diversidade de trabalhos marca a exposição

Por Ricardo Riso

Na sexta-feira terminará a boa e instigante exposição África?, com curadoria de Roberto Conduru, na Galeria Cândido Portinari da UERJ. Trata-se de uma ótima oportunidade para conhecer a recente produção de jovens artistas, com obras inspiradas na cultura afro-brasileira e suas matrizes africanas.

Essas propostas já nos legaram excelentes trabalhos como os de Hélio Oiticica, a constante e de altíssimo nível obra de Rubem Valentim, as belas esculturas orgânicas prontas para voar de Mestre Didi, além de Ronaldo Rêgo, Artur Bispo do Rosário, Abdias Nascimento e tantos outros que trilharam as incontáveis possibilidades de criação a partir das nossas raízes africanas e afro-brasileiras.

Conduru, com a competência característica, foi extremamente feliz ao abordar a multiplicidade temática e as várias linguagens apresentadas pelos artistas, o que demonstra a nossa complexa relação acerca da participação do que seria africano ou afro-brasileiro em nossa cultura. Daí, o pertinente título da exposição: África?, pois este questiona exatamente o conceito predominante do que representa o continente africano em nosso imaginário, sempre demonstrado com formulações simplórias e estereotipadas. É inevitável ao associarmos o título proposto pelo curador e não estendermos o pensamento à outra questão: Áfricas? O que seria uma apropriação mais ampla diante das várias manifestações africanas em nosso país e relidas por nós, alcançando novos prismas e diferenciando-se do outrora vindo da outra margem do Atlântico.

Logo, tal diversidade é natural em nossa cultura, conduzindo a uma fragmentação, a um hibridismo intenso que angustia quem pretende definir essas propostas sem considerar o constante diálogo e confronto entre as referências culturais, formadoras de nossa população. Um exemplo clássico poderia ser o nosso sincretismo religioso.

Ao olharmos para os trabalhos de África?, apreende-se como a hibridização cultural encaixa-se com as inquietações contemporâneas no campo das artes plásticas, sem abandonar a crítica social em relação à história do negro brasileiro. Quando se está à frente de trabalhos como os de Leila Dazinger, pode-se perceber esta linha de pensamento. Ao pintar sobre folhas de jornais, a artista denuncia a exclusão da situação desfavorável do negro, negada nos principais canais de comunicação.

Outra proposta interessante é a de Cristina Salgado e seus singelos rostos/máscaras indefinidos, imprecisos, inquietantes. Diante desses rostos feitos por Salgado, questiona-se qual é o rosto, ou melhor, quais são os rostos do(s) afro-descendente(s), escancarando o multiculturalismo brasileiro.

A instalação de Cristina Pape aproveita-se de algo muito comum em nossas vidas: as plantas de cura e as usadas na culinária. Um trabalho lírico, orgânico e irônico que mostra a forte presença dessas plantas e que esquecemos de sua origem africana.

Como não poderia deixar de ser, a presença da religiosidade encontra-se em Wuelyton Ferreira com entidades recriadas pelo artista, e a leveza apropriativa das missangas de Junior de Odê em uma instalação simbolizando os orixás. Assim como nas belas fotografias, carregadas em erotismo de Francisco Costa.

A exposição África? vale pela ausência de respostas. Vale pelas perguntas que faz ao visitante. Vale pelos trabalhos de alta qualidade, pela boa montagem. Vale por falar de uma parte da nossa cultura que tentam minimizar, mas que está aí, está por toda a parte, está em nós.


ÁFRICA?
Local: Galeria Cândido Portinari / UERJ
Rua São Francisco Xavier, 524 – Maracanã
Tel.: (21) 2587-7796 / 7182
Inauguração: 14 de outubro de 2008, a partir das 19h
Visitação: até 14 de novembro, de segunda a sexta, das 9h às 20h
ENTRADA FRANCA

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